Confissão e Fé de Westminster - Aula 7 - A Queda do Homem

Aula 07
A Queda do Homem


Introdução
Diante do ordenamento espiritual da realidade, isto é, do fato de Deus nos dar toda a realidade criada para ser um espelho da sua glória e nela nos dar o presente do desfrute completo da beleza dos atributos do seu ser, os teólogos de Westminster tratam também de explicar porque o homem não consegue desfrutar moralmente da realidade de forma a alcançar a graça de ver e experimentar Deus. 
Por isso, um dos capítulos mais importantes da CFW é o capítulo VI, no qual tratam da realidade caída do homem e de sua condição de impossibilidade natural de desfrutar da percepção de Deus no mundo criado. 
Vamos estudar conceitualmente este capítulo, aproveitando também para notar um detalhamento de como o texto produzido em Westminster é construído por meio de palavras conectoras. 

A Realidade do Pecado e Sua Principal Consequência
Os dois primeiros parágrafos do capítulo VI da CFW tratam principalmente da realidade do pecado na natureza humana e de sua consequente incapacitação do homem para alcançar o propósito criacional de desfrute da glória de Deus. 
Nossos primeiros pais, seduzidos pela astúcia e tentação de Satanás, pecaram ao comerem o fruto proibido. Segundo o seu sábio e santo conselho, foi Deus servido permitir este pecdo deles, havendo determinado ordená-lo para a sua própria glória (CFW, Cap VI-I).
O que se pode notar é que existe neste parágrafo duas partes. A primeira delas afirmando a origem do pecado e o modo como se introduziu na realidade humana. A segunda parte, fortalece a soberania divina sobre a criação, incluindo uma fórmula explicativa do porque Deus permitiu, por meio de um decreto, a presença do pecado. 
Embora, como veremos à frente, a grande perda tenha sido a percepção natural da glória de Deus na obra criada, essa realidade concorre, como podemos ver para a própria exaltação da glória de Deus em um padrão mais elevado que o criacional original, uma vez, que a queda torna necessária a redenção, que é a fórmula final da exaltação da glória de Deus.  
Por este pecado eles decaíram de sua retidão original e da comunhão com Deus, e assim se tornaram mortos em pecado e inteiramente corrompidos em toda as faculdades e partes do corpo e da alma (CFW, Cap.VI-II).
Pode-se notar um detalhe neste parágrafo que a cláusula de conexão. Este é um estilo que pode ser visto em toda a CFW. Veja que o parágrafo começa com a expressão: “Por este pecado...”. Essa cláusula toma um assunto que foi apresentado no parágrafo anterior e expande a sua compreensão. Mais à frente, note que o parágrafo, novamente é dividido em duas partes. Na primeira afirma a perda da sua retidão original e a comunhão com Deus. Na segunda o resultado desta perda. Essa dinâmica de expansão dos assuntos é uma marca da CFW. 
Perda de retidão original e comunhão com Deus– Esse é o ponto mais importante do efeito do pecado na natureza humana. Ela deixa de ter a percepção natural para agir no mundo segundo a vontade do Criador, encontrando o Criador em todas as coisas e na sua própria produção existencial, o que gera, concorrentemente, a perda da própria percepção de Deus e o encontro natural com o Criador na realidade. 
Inteiramente corrompido– a cláusula final da segunda parte, enfatiza a depravação total, que a CFW prefere denominar “corrupção total”. O uso do termo corrupção torna mais clara a intenção de revelar que o homem possuiu um potencial de comunhão com Deus que está desfigurado por causa da presença do pecado. 
A queda, portanto, acontece porque o homem cede à tentação de Satanás e isso leva a criação máxima de Deus à uma condição de incapacitação de se encontrar com o seu criador e atingir o seu propósito criacional máximo. 
Para sua própria glória– esse é um dos temas centrais de toda a teologia de Westminster. Aqui, ela é colocada em destaque como sendo o mais primordial intento de Deus em permitir a queda do homem, estabelecendo, desta forma um alvo final elevado para toda obra que será descrita no transcorrer da CFW, onde é apresentado ao homem o plano da salvação.

A Imputação da Culpa e dos Efeitos do Pecado
No terceiro parágrafo, encontramos é uma cláusula explicativa de como o pecado de Adão afetou toda a sua posteridade, por meio da imputação da culpa e dos efeitos do pecado. 
Veja o conectivo: “Sendo eles...” – Nossos primeiros pais do parágrafo primeiro, eles decaíram no segundo, chegando ao “sendo eles” do terceiro parágrafo. OU seja, o foco da discussão imposta é o resultado da ação dos “primeiros pais”, o seu desenvolvimento e as consequências dela. Neste parágrafo, a ênfase é mostrar a relação dos primeiros pais com toda a raça e as consequências desta relação.
Sendo eles o tronco de toda a humanidade, o delito de seus pecados foi imputado aos seus filhos, e a mesma morte em pecado, bem como a sua natureza corrompida, foram transmitidas a toda a sua posteridade, que deles procede por geração ordinária (CFW VI-III).  
Tronco da humanidade– Uma observação importante sobre a natureza do pecado é que ele não se trata apenas e tão somente de um problema moral do homem. Em outras palavras, os teólogos de Westminster estão trabalhando com a ideia de que o pecado é um “estado jurídico imputado”, ou seja, não somos pecadores apenas porque pecamos, mas porque descendemos de forma ordinária de Adão e Eva que pecaram. Essa ideia de representatividade em Adão e Eva é o que chamamos hoje de Teologia Federal, isto é, a teologia que indica que nossos primeiros pais nos substituíam representativamente diante da prova que Deus fez com a humanidade em Adão. 
A morte em pecado e a natureza corrompida– essas são as duas heranças que a queda de Adão nos transmitiu. A primeira, diz respeito ao estado de pecado, que é o estado de condenação à morte. OU seja, estamos afastados de Deus não somente porque não o conseguimos encontrar, mas fomos sentenciados a permanecer longe de Deus, que sendo santo, não pode comungar com o pecado, pois a Lei da sua santidade não permite isso. A outra transmissão é a natureza corrompida, isto é, a inclinação natural para continuar pecando e aumentando a abismal distância com Deus. Desta forma, não somente estamos afastados de Deus porque fomos condenados a este exílio, mas agora, também, porque desejamos moralmente ficar longe dele. 
Dessa corrupção original, pela qual ficamos totalmente indispostos, adversos a todo bem e inteiramente inclinados a todo mal, é que procedem todas as transgressões atuais (CFW VI-IV). 
 O parágrafo VI tem como objetivo fazer uma conexão necessária entre o pecado de Adão e os nossos pecados, chamados “atuais”. Ele dá a dimensão e a extensão dos danos do pecado na nossa condição de desfrute da vida e da realidade. 
Totalmente – inteiramente– esses dois termos são um ataque a qualquer teologia que presuma qualquer possibilidade de “bem na natureza humana”. Alguns acusam a teologia calvinista de ser extremamente negativa quanto ao homem e é. Contudo, esse negativismo não nasce do entendimento meramente filosófico, os calvinistas compreendem que a Escritura oferece essa interpretação da natureza humana: 
Não há justo, nem um sequer, não há quem entenda, não há quem busque a Deus; todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há nem sequer (Romanos 3.10-11). 
Portanto, a conclusão mais clara da origem do mal presente nas ações humanas é que elas decorrem da corrupção que recebemos de Adão por herança ordinária, imputada a nós como parte do juízo de Deus contra o pecado original. 
Indispostos – adversos – inclinados para o mal- Por isso, uma maneira correta de lidar com o mal presente no mundo atual, pensavam os teólogos de Westminster, seria considerar a inclinação natural do homem para o mal, que o impulsiona para longe de Deus. Essa inclinação natural, resulta de nossa indisposição para as coisas de Deus e nossa evidente luta contra Deus, representada na palavra “adversos”, o que indica em um nível de rebeldia e não somente indiferença.

A Continuidade da Queda e das Suas Consequências na Realidade Atual do Crente
Os parágrafos V e VI do capítulo VI da CFW é uma ampliação do conceito dos efeitos da queda inicial no dia a dia atual dos cristãos. Este ponto é importante para nossa consideração, pois é a partir deste conceito que se alcança uma verdadeira compreensão da realidade da natureza humana corrompida, o que explica e aponta o verdadeiro desafio a ser enfrentado na educação do povo de Deus e dos demais membros da sociedade humana.
Essa corrupção da natureza persiste, durante esta vida, naqueles que são regenerados, e embora seja ela perdoada e mortificada por Cristo, todavia tanto ela como os seus impulsos são real e propriamente pecado (CFW VI.V). 
Corrupção da natureza persiste durante a vida– os teólogos de Waestminster tinham uma percepção bastante realista da presença do mal no mundo e da resultante do comportamento humano. Eles compreendem que a maldade, isto é, a corrupção era uma visão clara de que o homem está comprometidamente corrompido e que, portanto, sua apostasia é natural e inerente ao seu comportamento. 
Os cristãos têm a presença e os impulsos da velha natureza– mesmo sendo regenerados pelo Espírito Santo, os cristãos possuem as inclinações pecaminosas e estas com seus impulsos nos colocam na mesma vala dos não crentes, pois ambos são grupos pecadores, afinal, a natureza pecaminosa permanece em nós nesta vida. 
Todo pecado, tanto o original como o atual, sendo transgressão da justa lei de Deus e a ela contrária, torna, pela sua própria natureza, culpado e pecador e por essa culpa está sujeito à ira de Deus e à maldição da lei, e, portanto, sujeito à morte com todas as misérias espirituais, temporais e eternas (CFW VI.VI).
Todo pecado está sujeito a morte e as misérias espirituais temporais e eternas– o ponto discutido neste último parágrafo é o efeito de todo e qualquer pecado, que leva a humanidade a viver em um estado de morte e miséria que se revela nas questões temporais como eternas. Aqui, se destaca a ideia de que, estamos lidando com um homem completamente adverso a Deus e à sua santidade, incapaz de fazer o bem e isso se revela na sua maldade para assuntos temporais e também eternos. Não se trata apenas de uma questão pós morte, mas em todas as coisas que o homem faz nesta vida também.  

Conclusão
Quando pensamos numa visão teofilosófica da queda, o que devemos pensar é sobre a profundidade do problema que enfrentamos na falta de disposição dos homens para a busca de Deus e a vivencia do shalom. 
A CFW propõe uma percepção da impossibilidade da humanidade de alcançar este estado de graça por si só, portanto, explica essa condição numa análise bíblica da condição caída do homem. Evidentemente, este capítulo será completado pelo capítulo seguinte que explica o pacto da graça de Deus, como a única possibilidade do homem de novamente ter comunhão com este Deus e desfrutar moralmente deste mundo de uma maneira abençoadora e shalômica.
Outro aspecto deste capítulo é que ele apresenta essa condição e queda ressaltando o estado da queda, isto é, a posição de condenação e a presença contínua dos seus efeitos que é a explicação dos seus efeitos sobre a vida humana cotidiana. A sentença da morte e a maldição da morte, ambos completam o quadro que nos leva a estar longe e adversos à Deus e à sua vontade.

Comentários

Postagens mais visitadas