Aula 2 - A Natureza dos Dons


Aula 2

A natureza dos dons para a reorganização teorreferente da realidade – ferramental shalômico

Introdução
Nesta aula, vamos nos voltar para a natureza dos dons espirituais em termos de sua característica prática. Desta forma, nossa busca nesta aula é a de verificar de que maneira os dons se situam como ferramentas para a reorganização shalômica da realidade.
Dividindo em quatro grandes grupos, notaremos que estes grupos de dons podem ser colocados em duas áreas gerais de atuação: Dons para o trabalho da reorganização da mente e dons para o trabalho de reorganização da realidade prática. 
Antes, porém, vamos nos deter em considerar a respeito da desordem que a queda produziu e como estas duas realidades, a mental e a prática, foram grandemente afetadas. Estas afetações são corrigidas no processo de redenção por meio da obra que Deus realiza, primeiramente na Igreja e através dela no mundo inteiro. 
Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade edificada sobre um monte; nem se acende uma cadeia para coloca-la debaixo do alqueire, mas no velador, e alumia a todos os que se encontram na casa. Assim, brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus (Mt 5.14-16).  

A Desordem da Queda. 
Como já vimos na aula passada, a Queda provocou uma desordem, especialmente no que diz respeito à missão original do homem que era o espalhar do shalom para toda a Criação. 
Contudo, a desordem produzida pela queda não está limitada apenas à missão humana, mas construiu também um sentimento de rebelião destrutiva contra Deus. O homem não se tornou somente um ser incapaz de perceber Deus e buscar a sua glória, o pecado tornou-o “inimigo de Deus”. 
A rebeldia humana não se manifesta apenas em um desinteresse pela glória do Criador, mas em um processo de rebeldia e oposição a toda a gloriosa estrutura da Criação, a oposição à Lei de Deus. 
Não há justo, nem um sequer, não há quem entenda, não há quem busque a Deus; todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer. A garganta deles é sepulcro aberto; com a língua, urdem engano, veneno de víbora está nos seus lábios, a boca, eles a têm cheia de maldição e de amargura; são seus pés velozes para derramar sangue, nos seus caminhos, há destruição e miséria; desconheceram o caminho da paz. Não há temor de Deus diante dos seus olhos (Rm 3.10-18). 
Essa condição humana de rebeldia, provoca uma deterioração na maneira como o homem lida com a lei criacional e se posiciona destrutivamente diante dela. 
O homem depravado cava o mal, e nos seus lábios há como que fogo ardente. O homem perverso espalha contendas, e o difamador separa maiores amigos. O homem violento alicia o seu companheiro e guia-o por um caminho que não é bom. Quem fecha os olhos imagina o mal e, quando morde os lábios, o executa (Pv 16.27-30). 
Este processo de desordem, portanto, não é só um erro ou falha em fazer o que é bom, mas se completa em um processo efetivo de maldade e está permeado de intencionalidade rebelde. 
Há no coração do ímpio a voz da transgressão; não há temor de Deus diante dos seus olhos. Porque a transgressão o lisonjeia a seus olhos e lhe diz que a sua iniquidade não há de ser descoberta nem detestada. AS palavras da sua boa são malícia e dolo; abjurou discernimento e a prática do bem. No seu leito, maquina a perversidade, detém-se em caminho que não é bom, não se desapega do mal (Sl 36.1-4). 
Uma vez que o homem ímpio atua com a rebeldia contra Deus operando em seu coração, o resultado de sua obra é um mundo em desequilíbrio funcional. Ele não sabe usar bem os recursos que Deus lhe deu para seu sustento e não consegue exergar a missão de espalhar o shalom teorreferente, ao contrário disto, um processo egocentrado está instalado e ele constrói um mundo de desamor ao próximo como marca mais fundamental. 
Trama o ímpio contra o justo e contra ele ringe os dentes (Sl 37.12). 

Dons Espirituais Como Ferramentas Shalômicas de Reordenação do Mundo Caído
Evidentemente, não estamos tentando reduzir nossa visão dos dons e dizendo que eles sejam somente isto. Mas, por outro lado, acredito que este tem sido um aspecto negligenciado da finalidade dos dons espirituais. 
Em outras palavras, devemos pensar nos dons espirituais não somente na sua utilidade para organização do mundo eclesiástico ou a sua funcionalidade no Corpo. Claro que a visão do apóstolo Paulo em 1 Coríntios 12 está primordialmente focada na igreja, mas devemos lembrar que a Igreja é a janela do Reino de Cristo, mas o Reino é Universal, isto é, para todos os homens e um dia será equalizado ao governo geral do mundo, pois um dia o Reino será completamente de Deus e do seu Cristo.
O reino do mundo se tornou de nosso Senhor e do seu Cristo, e ele reinará pelos séculos dos séculos (Ap 11.15). 
Este processo de reordenação do mundo caído tem uma meta criacional final. Isto implica em que devemos olhar o mundo como ele foi criado e como Deus quer que ele reencontre o caminho do shalom inicial.

Reorganização Mental e Prática
Tendo como ponto de partida as listas básicas do Novo Testamento, podemos situar os dons em dois espectros principais: a realidade mental e a realidade prática. 
Realidade mental- A realidade mental diz respeito ao modo como os filhos de Deus compreendem o mundo e o organizam em sua mente. Em outras palavras, devemos considerar que os seres humanos são criados para cuidar do Jardim de Deus e esta tarefa começa em uma apreensão cognitiva do mesmo. Ou seja, o homem precisa saber como o mundo funciona para mantê-lo funcionando corretamente. 
Realidade prática– evidentemente, a realidade prática é a mais tangível, porque diz respeito àquilo que vemos acontecendo diante de nós. Os filhos de Deus devem conceber o mundo segundo o padrão do Criador, mas devem agir na prática que encontra na sua realidade para nela interferir de modo a conduzir tudo para o padrão divino. 
Considerados a partir das listas que encontramos nas Escrituras do Novo Testamento, os dons parecem se dirigir a estas duas realidades na busca de serem ferramentas para atuar diretamente em cada uma delas: 
Em 1 Pedro 4.11, ao descrever a atuação dos filhos de Deus no mundo, ele relaciona essa ação dividindo-a em dois aspectos principais: “se alguém fala” e “se alguém serve”. 
Se alguém fala, fale de acordo com os oráculos de Deus; se alguém serve, faça-o na força que Deus supre, para que, em todas as coisas, seja Deus glorificado, por meio de Jesus Cristo, a quem pertence a glória e o domínio pelos séculos dos séculos. Amém (1 Pedro 4.11).
Nesta divisão, o apóstolo propõe uma idealização da ação cristã em duas pontas, a primeira diz respeito à assuntos de ordem conceitual – a fala, isto é, o anuncio da verdade. Por outro lado, ele também aponta para ações práticas, quando diz que, enquanto uns “falam” outros “servem”. 
Fala de acordo com os oráculos de Deus– falar de acordo com os oráculos de Deus é um espalhar da verdade sobre a realidade. O apóstolo, portanto, está apresentando uma pessoa que não fala aquilo que ela compreende do mundo, mas aquilo que Deus a ensina sobre o mundo.
Serve na força que Deus supre– Algo significativo nisto que Pedro fala sobre o serviço é que a medida deste agir prático tem a ver com as possibilidades que Deus nos dá para servir. Desta forma, o que se fica mais claro é que a medida do serviço não é a minha vontade ou o meu entusiasmo, mas a vontade de Deus para minha ação no mundo. 
Para que em todas as coisas Deus seja glorificado– o objetivo final é que todos vejam Deus. Para tanto, as pessoas precisam aprender conceitualmente e desfrutar da realidade prática de Deus. 
Por meio de Jesus– com certeza, o que temos em tela é que esta possibilidade só existe na mediação de Jesus Cristo que foi quem nos uniu ao Pai, por meio da sua morte na cruz, proporcionando que fôssemos incluídos na Aliança, assim como também nos deu vida no Espírito Santo e agora distribuiu seus dons sobre os homens e nos deu vida em abundância. 
A Jesus a glória e o domínio eternamente– o propósito final é a glorificação do Filho, pois ele é detentor destes direitos, os quais recebeu do Pai por herança (Hebreus 1.1-4) e agora é Ele o Senhor de todas as coisas. NO final, os dons são um projeto de reordenação do mundo para a glória do Filho. 

Conclusão
Devemos considerar os dons dentro de um projeto criacional final de glorificação do filho por meio da Criação. O nosso trabalho é reordenar o mundo, ensinando a verdade sobre a realidade e trazendo a vida prática de volta ao princípio shalômico da adoração de Deus e o reencontro do homem com o seu Criador.
Os dois polos de ação: intelectual e prática, se combinam para construir um novo modelo de homem em ação no mundo, aquele que pense o mundo teorreferentemente e intervém na realidade segundo esse novo modo de pensar. Este novo homem, que tem o conhecimento de Deus é o agente shalômico que serve a Deus trazendo a reorganização teorreferente da realidade. 

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